quinta-feira, janeiro 19, 2006

De volta a cidade


A um mundo de rios quebrados
e distâncias inatingíveis
na patinha desse gato quebrada pelo automóvel,
e eu ouço o canto da lombriga
no coração de muitas meninas.
Óxido, fermento, terra estremecida.
Terra tu mesma que nadas pelos números do escritório.
Que vou fazer? Ordenar as paisagens?
Ordenar as árvores que logo são fotografias,
que logo são pedaços de madeira e goles de sangue?
Santo Inácio Loiola assassinou um pequeno coelho
e ainda seus lábios gemem pelas torres das igrejas.
Não, não, não, não; eu denuncio.
Eu denuncio a conjura desses desertos escritórios
que não irradiam as agonias, que apagam os programas da selva,
e ofereço-me para ser comido pelas vacas espremidas
quando seus gritos enchem o vale
onde o rio Tietê se embriaga com azeite.

Gabriel de Garcia Lorca
1929

3 comentários:

Anônimo disse...

CONTRA A MONOTONIA, ARTE, MUITA ARTE

Quando uma criança faz algo que os pais não gostam - ou não têm paciência para entender/apoiar -, logo recebe a bronca: "Deixe de fazer arte, menino!" A arte e seus promotores sempre tiveram uma ligação estreita com a transgressão, correndo à margem do que a sociedade espera, atura, permite. Da música à literatura, da poesia aos espetáculos de dança e/ou teatro, muito já se fez ao longo da existência humana que fugia aos padrões da sociedade.

Por isso acho duca intervenções como a que fizeram na cidade esta semana, colando desenhos em placas de trânsito. Tive a oportunidade de ver uma delas na Avenida Dr. Arnaldo. Estava preso num baita engarrafamento (sou carioca, esqueceu?), distraído, quando de repente, pimba! Uma mosca pousou na placa. Eu olhei de novo, talvez fosse uma miragem, que nada, é uma mosca sim! Senti o sorriso invadindo minha face. Ok, estragou a placa, vai custar alguns caraminguás à Prefeitura - talvez bem menos do que alegam, afinal, não acredito que o quer que seja que colaram na placa seja irremovível - mas esse tipo de interferência em nossa rotina é sinal de que há vida criativa pulsando pela cidade. Não somos tão autômatos quanto parecemos quando estamos todos seguindo nossos caminhos para casa, trabalho, happy-hour, cinema, o que seja. Aquela mosca, o revólver, a borboleta, flores e outros desenhos que colaram por aí são a imaginação de alguém invadindo a realidade. Do nada surge uma faísca de inventividade, espoca a idéia na cabeça de um e se transforma em algo concreto, divertindo, irritando, causando emoções.

Uns classificaram de brincadeira de mau gosto, outros de vandalismo, ou mesmo crime. Pra mim, foi arte. E das boas.

Jorge Cordeiro disse...

Ei, meu caro! que tal uma entrevista pro meu blog, O Escriba? De quebra, reproduz lá no outro, o Ronda Paulistana, do Globo Online SP, que tal? Faz tempo que quero escrever sobre essas intervenções na cidade, comparar com o trabalho genial do Bansky em Londres... bora? pode ser por email, mesmo, te mando cinco perguntas.

valeu!

Jorge Cordeiro disse...

pô, entrevista pra folha pode, pra blog nao?